Há 100 anos, italianos fundaram o maior campeão do futebol brasileiro
GAZETA ESPOTE
Em 26 de agosto de 1914, na Rua Marechal Deodoro, italianos fizeram questão de fundar um clube que congregasse sua colônia em São Paulo e focado no futebol. Para dar certo, passaram meses treinando até entrar em campo. Nasceu o Palestra Itália. Nesta terça-feira, a preocupação em ter sucesso completa um século no qual o clube superou até a forçada mudança do nome para Palmeiras e se tornou o maior campeão do Brasil.
Ao longo dos anos, o clube que nasceu para unir imigrantes italianos comprou seu estádio já em 1920 e virou exemplo no país do futebol. Foi modelo de qualidade em campo e, por seus títulos, ganhou a alcunha de campeão do século XX da Federação Paulista de Futebol e de publicações como o jornal Estado de São Paulo e a revista Placar.
Ninguém no País tem mais títulos nacionais do que o Palmeiras, vencedor de oito Brasileiros com a unificação promovida pela Confederação Brasileira de Futebol, de duas Copas do Brasil e da Copa dos Campeões em 2000. Nem agremiações mais antigas, como Corinthians, Santos, Flamengo e Vasco, conseguem superar os números do Verdão.
Acervo/Gazeta Press
O auge das conquistas nacionais ocorreu com a única equipe capaz de parar Pelé, que, na verdade, foi incapaz de bloquear quem ensinava e jogava ao mesmo tempo. Se Palestra significa academia em grego, o Palmeiras também ganhou este nome entre 1959 e 1974. A Academia de Futebol simbolizada na inteligência de Ademir da Guia virou, literalmente, sinônimo de Brasil em 7 de setembro de 1965, quando o elenco todo representou a Seleção Brasileira e venceu o Uruguai por 3 a 0 no Mineirão. A Confederação Brasileira de Desportos, antecessora da CBF, fez questão contar também com o argentino Filpo Núñez, até hoje o único estrangeiro a dirigir o time nacional.
Uma resposta a quem, um dia, se negou a ver o claro valor brasileiro do Palestra Itália. Em meio à Segunda Guerra, o clube foi pressionado a mudar de nome, sob ameaça de perder seu patrimônio. Não bastou virar Palestra de São Paulo. Mas o que poderia ser uma derrota ou fim de um time já vencedor virou a chance de provar que as vitórias não estão no nome, mas no espírito de quem veste a camisa verde.
Acervo/Gazeta Press
"Não nos querem Palestra, pois seremos Palmeiras e nascemos para ser campeões", definiu o conselheiro Mario Minervino, na época. Em 20 de setembro de 1942, o clube entrava pela primeira vez em campo como Palmeiras e pisava no Pacaembu carregando uma bandeira nacional. Provou ser ainda mais brasileiro com a bola nos pés. Diante do São Paulo, acusado de ser quem mais pressionou para ter patrimônios palestrinos, impôs vitória por 3 a 1 e viu o rival abandonar o jogo. O Palmeiras já nascia campeão paulista no episódio conhecido como Arrancada Heroica.
Reprodução/A Gazeta Esportiva
Nove anos depois, mais uma prova de brasileirismo. Na conquista que hoje a Fifa considera como o primeiro título mundial interclubes da história, o Palmeiras conquistou a Copa Rio em 1951, dando um alento ao futebol do País depois do sofrido vice-campeonato na Copa do Mundo no Maracanã. Mesmo sem a camisa verde, os palmeirenses orgulhavam o Brasil, já que a Seleção nunca foi campeã mundial sem ter um jogador do clube.
Sucesso que explica a sobrevivência como um dos grandes mesmo com o jejum de títulos entre 1976 e 1993. O clube não teve medo de inovar e se juntar à empresa italiana Parmalat, estratégia pioneira que formou verdadeiras seleções em campo, gerou a inesquecível conquista do Paulista de 1993 com 4 a 0 sobre o arquirrival Corinthians na final que eternizou Evair como ídolo e teve como ápice a Libertadores de 1999, um dos poucos títulos que faltavam ao legítimo campeão do século XX e no qual o goleiro Marcos virou santo pelos milagres que executou.
A camisa verde também se mostrou forte fora do gramado. No basquete, Rosa Branca, Edson Bispo, Mosquito e Jatyr, em 1960, e Jatyr, Edson Bispo e Victor Mirshauswka, em 1964, conquistaram o bronze olímpico como atletas do clube, assim como o judoca Henrique Guimarães com o terceiro lugar nos Jogos de 1996.
Se o século XXI é de indignação, incluindo dois títulos de Série B do Brasileiro que torcedores preferem esquecer e a luta contra um novo rebaixamento nesta temporada, a explicação está na incontestável e vitoriosa história palmeirense. E na certeza de que o gigante nascido há 100 anos nunca se diminuiu nem ficará menor diante de qualquer adversidade que aparecer. Será sempre imponente.
“Meu mundo tem Palmeiras”: ídolos
declaram amor pelo clube; assista
GloboEsporte.com encerra especiais do 100º aniversário alviverde com videorreportagem com ex-jogadores que marcaram época no clube
Dia 26 de agosto de 1914. Um clube de origem italiana nascia na cidade de São Paulo para marcar o futebol brasileiro. A agremiação que surgiu como Palestra Italia com objetivo de reunir os imigrantes em prol do esporte, hoje, dia 26 de agosto de 2014, já como Sociedade Esportiva Palmeiras e diversos títulos depois, festeja seu 100º aniversário.
Em homenagem aos torcedores de um dos maiores e mais vitoriosos clubes do país, o GloboEsporte.com fecha suasérie de matérias especiais sobre a história alviverde com a apresentação da videorreportagem: “Meu mundo tem Palmeiras”.
Com depoimentos de craques que marcaram época no coração dos palmeirenses, o torcedor poderá relembrar alguns dos diversos momentos mais celebrados neste centenário.
Neste time de ex-jogadores consagrados, Marcos, Emerson Leão, Velloso, Luis Pereira, Roberto Carlos, Dudu, Galeano, César Sampaio, Ademir da Guia, Alex, Leivinha, Zinho, César, Edmundo e Evair relembram momentos inesquecíveis, vestem a camisa e se declaram ao Verdão.
EMERSON LEÃOConfira trechos de alguns depoimentos:
- É legal esse carinho, sou cumprimentado na rua até hoje. Eu joguei no Palmeiras, no Corinthians, no Grêmio, no Sport e no Vasco, mas não tem jeito. Aonde eu passo falam: “Olha lá o Leão do Palmeiras”. Eu joguei no Palmeiras o mesmo tempo em que eu joguei na Seleção, mas ninguém fala o Leão da Seleção, sou o Leão do Palmeiras. Está certo que eu sou de origem italiana, meus pais eram palmeirenses, mas, quando você se torna profissional, você gosta daquilo que você faz e se dedica ao clube que você está. Mas claro que tem a origem, e o Palmeiras representou muita coisa para mim.
Emerson Leão diz que até hoje é parado nas ruas como "o Leão do Palmeiras" (Foto: Sergio Gandolphi)
MARCOS
- Não consigo imaginar meu mundo sem Palmeiras. O Palmeiras foi tudo na minha vida. Se você me perguntasse hoje em dia o que eu teria feito se eu não tivesse sido jogador eu não consigo nem imaginar. Tudo o que eu faço no meu dia a dia não tem como não ter o Palmeiras na minha vida. Foram 20 anos jogando e 20 anos torcendo antes de jogar. E agora estou torcendo novamente. Não consigo acordar um dia da minha vida sem ter de falar o nome do Palmeiras pelo menos uma vez. Isso é dentro de casa, fora, em qualquer lugar. Minha vida tem Palmeiras todos os dias.
Alex, com a camisa do Palmeiras de sua época de jogador (Foto: Sergio Gandolphi/GloboEsporte.com)
ALEX
- Meu mundo tem Palmeiras totalmente. Se você for na minha casa, eu tenho um filho que tem quatro anos. E o menino fica dividido entre o Coritiba, o Cruzeiro, o Fenerbahçe e o Palmeiras. As coisas vão se misturando. Na minha casa tem muito Palmeiras, na minha vida tem muito Palmeiras. Meu carinho e meu respeito pelo clube são muito grandes. Não tenho como separar a minha vida sem ter o Palmeiras.
Ademir da Guia, em um dos campos da Academia de Futebol (Foto: Sergio Gandolphi)
ADEMIR DA GUIA
- Meu mundo é feito de muitas palmeiras. Aonde eu vou encontro o verde. Eu tenho essa alegria muito grande e está na minha vida diariamente. O telefone não para, os convites não param. Jogo sábado e domingo. Um dia bati meu recorde e joguei sexta, sábado e domingo. Na segunda eu estava um pouco cansado (risos). Leia entrevista completa com Ademir.
CÉSAR MALUCO
- Meu mundo tem muito Palmeiras. Meu mundo é verde. A minha caminhada sempre foi em jardins, sempre verde. O Palmeiras é tudo. Não encontro palavras para falar.
ZINHO
- Foram seis anos maravilhosos de convivência, seis anos de alegrias e conquistas. O Palmeiras me possibilitou ganhar títulos e ser o Zinho. O clube foi fundamental para que o meu nome fosse marcado na história do futebol. Foi o Palmeiras que me possibilitou ir para a Seleção e ser campeão do mundo. Nesse período em que o Palmeiras faz aniversário, eu que fui presenteado por ter vestido a camisa do clube. Foi motivo de orgulho na minha vida e na minha carreira.
César Maluco: "Meu mundo é verde" (Foto: Sergio Gandolphi)
EVAIR
- Meu mundo tem Palmeiras 24 horas. É difícil separar a minha vida e minha carreira. Em cada lugar que eu vou eu sou lembrado por ter jogado no Palmeiras. Ganhei vários títulos, fui campeão pelo Vasco, contra o Palmeiras, mas pouca gente se lembra. Fui jogar num dos rivais e o torcedor me perdoou por isso. Meu mundo tem Palmeiras a cada instante. Não consigo separar a minha vida sem essas cores. Aonde eu vou dizem que eu sou palmeirense e as pessoas se manifestam.
ROBERTO CARLOS
- Meu mundo tem Palmeiras porque foi ali que começou toda a minha vida no futebol. Foi ali que muitas coisas maravilhosas aconteceram. Era gostoso chegar nos treinamentos e colocar o escudo do Palmeiras no peito. Meu mundo é Palmeiras.
Separados no nascimento: lendas e fatos da ligação entre Verdão e Timão
Ao contrário de Flamengo e Fluminense, rivais paulistas não nasceram da costela do outro, mas estão ligados pelas trajetórias de jogadores e dirigentes em comum
"O Palmeiras nasceu de uma dissidência do Corinthians". A frase, repetida e reescrita várias vezes, não passa de uma lenda - e não uma verdade. É o que garantem os historiadores dos dois clubes. Os rivais do clássico deste domingo, às 16h, na Arena Corinthians, palco pela primeira vez do Dérbi paulista, têm uma forte ligação, quase centenária. Mas a origem de um não partiu da costela do outro, como ocorreu com Flamengo e Fluminense, por exemplo.
- O Corinthians agregava todas as colônias. Quando o Palestra nasce, muitos ex-corintianos italianos se tornaram palestrinos, porque não havia uma que os representasse. É diferente de Flamengo e Fluminense, por exemplo, em que o Flamengo teve a sua seção de futebol criada por ex-jogadores do Fluminense. Isso sim é uma dissidência. O Palestra, não - explica Celso Unzelte, historiador do Corinthians e autor de almanaques sobre a história de Timão e Verdão.
Entre os fundadores do Palestra Itália, nenhum corintiano... (Foto: Acervo Histórico Sociedade Esportiva Palmeiras)
Fernando Galuppo e Jota Christianini, historiadores ligados ao Palmeiras, corroboram o depoimento de Unzelte. Eles se baseiam muito no relato de Etelvina Cervo, filha de Luigi Cervo, um dos quatro fundadores do Palestra - os outros foram Luigi Marzo, Vicente Ragognetti e Ezequiel Simone. Nenhum teve ligação anterior ou posterior com o Corinthians. Em 2009, em entrevista à equipe do acervo histórico do Verdão, Etelvina explicou:
- Decidiram fundar o Palestra Italia, pois não havia um grande clube de colônia italiana em São Paulo na época. O Palestra nasceu na Matarazzo, fruto de uma iniciativa de parte de seus funcionários. Não tem nada a ver essa história de que o Palestra é dissidência do Corinthians. Não sei de onde tiraram isso.
Apesar de a dissidência ser uma lenda, alguns pontos unem os rivais desde o início das respectivas trajetórias, passando por um dos fundadores e chegando aos autores dos primeiros gols - tanto do Palestra como do Palmeiras, nome que o clube passou a adotar em 1942, por conta da pressão sobre os italianos no Brasil, em virtude da II Guerra Mundial.
MEZZO ALVINEGRO, MEZZO PALESTRINO
Raphael Perrone, fundador do Timão, virou sócio e diretor do Palmeiras (Foto: Acervo Corinthians)
Raphael Perrone, um dos operários responsáveis por fundar o Timão, em 1º de setembro de 1910, virou sócio e até diretor do Palestra Italia nos anos 30. Ou seja, mais de 15 anos depois da fundação do clube alviverde, criado em 26 de agosto de 1914. Seu irmão, Giuseppe Perrone, chegou até a presidir os palestrinos nos anos 20.
- Era comum haver sócios de diversos clubes até os anos 70. Naquela época, os diretores eram esportistas. Se tirarmos o contexto histórico, parece algo fora do comum, mas houve diretores do Palmeiras, por exemplo, que presidiram outros clubes e participaram da diretoria do Atlético-PR - conta Fernando Galuppo.
Jota Christianini também lembra que houve fundadores do Palestra participantes na criação do Juventus, clube fundado por italianos no outro lado da cidade de São Paulo, na zona leste.
GOLS CORINTIANOS... PELO PALESTRA
Bianco, autor do primeiro gol da história do Palestra, pertencia ao Corinthians (Foto: Acervo Histórico S. E. Palmeiras)
Dentro de campo, os rivais sempre estiveram ligados. Tanto que a primeira formação do time do Palestra Italia (Nota da Redação: a grafia sem acento é baseada na língua nativa, diferente de quando se escreve o nome do país em português) tinha cinco jogadores emprestados do Corinthians. Fúlvio, Police, Bianco, Américo e Amílcar participaram da vitória por 2 a 0 sobre o Savoia, em Sorocaba, no dia 24 de janeiro de 1915. Bianco, inclusive, fez o primeiro gol da história do Palestra, depois de ter sido campeão paulista com o Timão em 1914, e marcou época no clube.
Vale ressaltar, porém, que ter atletas emprestados de diferentes equipes era praxe na época. Tanto que o Palestra também reuniu jogadores voluntários de raízes italianas de times como Paulistano, Internacional, Lusitano, Ruggerone e Campos Elyseos, entre outros, além do próprio Corinthians.
Do outro lado, o italiano Luigi Salvatore Fabbi, o Luiz Fabi, também é pivô de outra ligação quase umbilical entre os rivais. Autor do primeiro gol da história do Corinthians, na vitória por 2 a 0 sobre o Estrela Polar, em 14 de setembro de 1910, ele foi em 1915 para o Palestra Italia, onde seu irmão Matturo atuava.
No primeiro jogo da história do Palestra Italia, contra o Savoia, em 1915, cinco dos jogadores foram emprestados pelo Corinthians (Foto: Acervo Histórico Sociedade Esportiva Palmeiras)
ÍDOLO CORINTIANO NA HISTÓRIA ALVIVERDE
Ainda que não tenha havido dissidentes nas respectivas fundações, Corinthians e Palmeiras estão ligados desde antes de a rivalidade existir.
Claudio, maior artilheiro da história do Timão, fez 1º gol do Verdão como Palmeiras (Foto: Acervo Corinthians)
O que começou entre Palestra Italia e Corinthians seguiu forte quando o Verdão virou Palmeiras. Após a mudança de nome, em setembro de 1942, em virtude da Segunda Guerra Mundial, a equipe teve o São Paulo como primeiro adversário. A vitória por 3 a 1, no dia 20 de setembro de 1942, teve Cláudio Christovam de Pinho como autor do primeiro gol do novo Palmeiras.
O detalhe é que o "Gerente", apelido do ex-jogador revelado pelo Santos, depois se tornou o maior artilheiro da história do Corinthians. Foram 305 gols em 549 jogos, números conquistados nas campanhas de diversos títulos alvinegros do antigo ponta-direita.
Como se não bastasse tudo isso, ele também foi o maior artilheiro do Dérbi, com 21 gols, além de ter atuado pelos quatro grandes clubes de São Paulo.
Até 26 de agosto, data do centenário do Palmeiras, o GloboEsporte.com publicará uma matéria por dia contando a história do clube que nasceu dos italianos e hoje é um dos maiores do Brasil e do mundo.
Os 17 mais longos anos do centenário: a história da quebra do jejum, em 1993
Craques como Evair e Roberto Carlos relembram o título paulista conquistado sobre o rival Corinthians, com o supertime montado pela Parmalat
Depois da Academia, o Palmeiras teve de enfrentar um dos piores momentos de sua história. Do título paulista de 1976, vencido em pleno estádio Palestra Italia (até hoje o recorde de público do local, com 40.283 torcedores) com uma vitória por 1 a 0 diante do XV de Piracicaba, gol de Jorge Mendonça no fim da primeira etapa, o clube só voltou a ser protagonista em 1993.
E foi em grande estilo, com direito a polêmica, provocação e uma goleada inesquecível na partida em que o Verdão confirmou a taça diante do maior rival. Mas a preparação começou antes, em 1992, quando o clube assinou uma parceria com a Parmalat, multinacional de laticínios que passou a investir pesado em contratações.
Herói daquele time, Evair, que no ano passado repetiu os passos na área do Morumbi em comemoração aos 20 anos da conquista estadual, tem um currículo invejável no Palmeiras. Além do Paulistão, o ex-atacante comemorou um título da Libertadores e duas conquistas do Campeonato Brasileiro. Mas ele não tem dúvida em classificar o estadual de 1993 como o mais especial.
– Eu me tornei ídolo naquele dia 12 de junho de 1993. Esse jogo resume o que foi a minha história no Palmeiras. Daquele titulo para cá que o palmeirense passou a confiar em mim. O palmeirense só tem alguém como ídolo quando essa pessoa demonstra ter vestido a camisa com vontade, determinação e título. Aquele dia foi um marco para mim – afirma.
Em pé, da esquerda para a direita: Mazinho, Roberto Carlos, César Sampaio, Tonhão, Sérgio e Antônio Carlos;
Edmundo, Daniel, Evair, Edilson e Zinho: o time campeão paulista em 1993 (Foto: Agência Gazeta Press)
PARCERIA E CRAQUES
A cogestão com a Parmalat trouxe ao clube nomes de destaques como Antônio Carlos, Edmundo, Roberto Carlos, Zinho, Edílson, entre outros. Depois de bater na trave e ficar com o vice-campeonato paulista de 1992, em dezembro, o clube entrou em janeiro de 1993 na estrada que o recolocou definitivamente no caminho dos títulos.
Tonhão e Roberto Carlos, na final do Paulistão de 1993 (Foto: Fernando Santos / Folhapress)
– Em 1992 já tínhamos chegado à final, não era um supertime, era um time mediano, mas era aguerrido e sabia vestir a camisa do Palmeiras. Perdemos, mas chegamos. Em 1993, muitos jogadores foram contratados e já existia uma preparação para o título. Nós sabíamos que fazíamos parte de um grande grupo e que poderíamos ser campeão. Para chegar até ali foi muito difícil. São coisas que só acontecem dentro do Palmeiras – relembra Evair.
– Claro que você via as contratações de jogadores jovens e de atletas experientes, mas eu não sabia que o Roberto Carlos ia virar o Roberto Carlos, assim como Edílson e Edmundo. Eles eram muito jovens. O Edmundo tinha uma passagem boa pelo Vasco, mas o Roberto vinha de um time menor e o Edílson não tinha conquistado títulos na carreira. No banco tinha jogadores de altíssimo nível. Formou-se um grupo muito forte, não era uma equipe com 11 jogadores apenas. Por isso que nós começamos a acreditar na chegada de conquistas importantes – completa Zinho.
Edmundo parte, marcado por Marcelinho Paulista (Foto: Vidal Cavalcante / Agência Estado)
Um dos principais nomes daquele time foi o lateral-esquerdo Roberto Carlos. Revelado nas categorias de base do União São João, de Araras (SP), ele já tinha até sido convocado para a seleção brasileira quando desembarcou no Palmeiras, aos 19 anos.
E o promissor talento não precisou de muito tempo para assimilar o que o clube e os torcedores mais desejavam naquele momento.
– Nós entrávamos em campo sabendo que estávamos tirando um peso das costas do torcedor. Todo mundo ganhava, menos o Palmeiras. Foram 16 anos sem ganhar um Paulista – conta Roberto Carlos.
– Não é que éramos imbatíveis, mas éramos um time muito forte. Naquela época não tinha equipe mais forte que o Palmeiras, com jogadores com tanta história, experientes e de seleção. Nós sabíamos que nosso time poderia fazer história – completa o ex-lateral.
Evair arrisca cobrança de falta (Foto: Vidal Cavalcante / Agência Estado)
JEJUM DE TÍTULOS
Apesar da grande espera e ansiedade, aquele 12 de junho – o dia em que o verde voltou a ser cor (veja no vídeo acima) – fez valer a pena todos os minutos de angústia e desilusão vividos pelos torcedores ao longo da década de 1980.
Mesmo se tratando de um período nulo de conquistas para o Verdão, o clube conseguiu formar grandes times e chegar até as decisões. Mas, tropeços diante da Inter de Limeira, na final do Paulistão de 1986, e do Bragantino, a única derrota da equipe no estadual de 1989, acabaram interrompendo e aumentando o sofrimento dos torcedores.
Mazinho, Evair e Zinho vibram pelo Palmeiras
(Foto: Masao Goto Filho / Agência Estado)
Treinador do Palmeiras em 1989, Emerson Leão por pouco não se eternizou ainda mais na história do clube. O tropeço em Bragança Paulista do técnico Vanderlei Luxemburgo adiou por mais alguns anos o fim do jejum. Para o ex-goleiro, faltava tranquilidade aos dirigentes da época para montar uma equipe.
– Tudo está relacionado com a capacidade. Os outros cresceram, e o Palmeiras não cresceu na mesma capacidade. Mesmo assim, quando eu fui técnico pela primeira vez nós jogamos o campeonato inteiro invicto. Era superior, mas na fase final foi desclassificado. Infelizmente isso acontece. É nessas horas em que você precisa ter sustentação do trabalho. Não é por causa disso que precisa mudar tudo. Tinha que melhorar aquele time – conta Leão.
– Eu me lembro que alguns presidentes pediam opinião para nós depois de títulos e perguntavam o que o time precisava. Faltava um ponta, um atacante? Escolhiam o melhor e compravam na hora. Não estavam satisfeitos com o bom, queriam o melhor. Não estavam satisfeitos com o melhor, queriam o excelente. Não estavam satisfeitos com o excelente, queriam o maravilhoso. E depois, ia pra onde? Para a Academia – completa.
Torcida do Palmeiras vibra nas arquibancadas do Morumbi (Foto: Vidal Cavalcante / Agência Estado)
Comandante da última conquista, em 1976, o ex-volante Dudu não consegue encontrar palavras para descrever o longo jejum alviverde. Ele ainda dirigiu o clube em 1981, e depois entre os anos de 1990 e 1991.
– Eu assumi no lugar do Dino Sani. Era auxiliar e não queria porque achava que era muito cedo. Mas como eu gosto do clube aceitei. Depois, eu não tenho ideia porque ficou tanto tempo sem ser campeão depois daquela conquista de 1976 – afirma.
Zinho comemora gol pela final do Paulistão (Foto: Ormudzd Alves / Folhapress)
PROVOCAÇÃO E MAIS FESTA
No primeiro duelo, vitória corintiana por 1 a 0. Mas o improvável gol de Viola após cruzamento de Neto ficou em segundo plano na semana que antecedeu ao último duelo. O que mais foi comentado por jogadores, jornalistas e torcedores foi a comemoração do atacante do Timão.
Após surpreender Sérgio e desviar a bola para o gol com o pé esquerdo, Viola caiu fora do campo. Irreverente, o atacante não se levantou rapidamente e aproveitou alguns segundos para festejar a vantagem alvinegra imitando um porco.
Evair celebra um dos gols da vitória sobre o Corinthians (Foto: Djalma Vassão / Agência Estado)
A provocação empolgou o lado corintiano e enfureceu os palmeirenses. Para evitar que a pressão aumentasse ainda mais, Vanderlei Luxemburgo optou por isolar sua equipe durante a semana inteira na cidade de Atibaia, no interior.
– Foi meu jogo mais marcante, não pela vitória em si, mas pelas duas semanas que tivemos de pressão, pelo gol do Viola e toda aquela imitação do porco, pela rivalidade. Eu sentia muita tensão e muita cobrança naquele momento. Nós não podíamos deixar o torcedor palmeirense triste. E já tínhamos deixado uma semana antes. Aquela segunda partida foi o jogo das nossas vidas. Foram duas semanas marcantes – lembra Roberto Carlos.
Tonhão carrega Edmundo (Foto: Vidal Cavalcante / Agência Estado)
A tranquilidade só veio aos 36 minutos do primeiro tempo da segunda final, após o chute de pé direito de Zinho que passou por Ronaldo e tocou a trave antes de morrer no fundo da rede. Daquele lance em diante, o Palmeiras não apenas confirmou o título paulista de 1993 – Evair (duas vezes) e Edilson fecharam o placar em 4 a 0 – como abriu caminho para uma das épocas mais vitoriosas do clube.
– Aquele título marcou muito pela maneira que foi, pelo meu gol de pé direito (risos)... A conquista fortaleceu o grupo porque tirou um peso. O primeiro grande objetivo, que era o Palmeiras voltar a ser campeão, tinha sido alcançado. Isso deu força para o grupo. E jogar ganhando, sem pressão e em um time de altíssimo nível, era muito melhor – recorda Zinho.
– Em 1992 e 1993 o time já tinha cara de voltar a ser campeão. Depois do Paulista quebrou o jejum de títulos no Brasileiro, depois veio o bi. O Palmeiras passou a ser novamente colocado como grande e voltou a conquistar títulos. E por isso hoje é um dos times mais respeitados do Brasil. Não é fácil ser campeão tantas vezes – finaliza Evair.
Edmundo exibe a camisa do Verdão (Foto: Sergio Gandolphi)
Evair recriou no ano passado o gesto que imortalizou na comemoração de 1993 (Foto: Marcos Ribolli)
Zinho, com a camisa de 1993, em foto tirada em 2013, antes de ele virar gerente do Santos (Foto: Sergio Gandolphi)
Tonhão exibe a camisa do Palmeiras (Foto: Sergio Gandolphi)
15 COISAS QUE O TORCEDOR NÃO SABE
ENTRE PALMEIRAS E A PARMALAT
ENTRE PALMEIRAS E A PARMALAT
Empresa colocou vários craques no clube e gerenciava o departamento de futebol, mas contrato nunca foi assinado. Maradona seria a grande estrela da cogestão...
Não há torcedor que tenha passado indiferente à era Parmalat. O palmeirense viu findar um jejum de quase 17 anos sem títulos e entrou numa era gloriosa. Taça atrás de taça, voltas olímpicas a rodo, craques e mais craques vestindo verde e branco. Os rivais sofreram com a supremacia técnica e financeira do time de Evair, Edmundo, César Sampaio, Rivaldo, Djalminha, Luizão, Edílson, Roberto Carlos, etc, etc...
Em campo, o Verdão comemorou dois títulos brasileiros, três paulistas, dois torneios Rio-São Paulo, uma Copa do Brasil, uma Copa Mercosul, uma Copa das Campeões e a Libertadores. Fora de campo, a parceria foi marcada por acordos, brigas, confusões, confiança, ídolos, acusações... Bastidores que o GloboEsporte.com relembra no centenário do clube.
Histórias marcadas pelo sangue quente italiano correndo nas veias. Um sangue verde. Confira abaixo 15 coisas que (talvez) você não sabia sobre a parceria entre Palmeiras e Parmalat:
CONTRATO
O documento que oficializou o acordo entre Palmeiras e Parmalat, vigente de 1992 a 2000, jamais foi assinado. Presidente do clube quando a parceria foi iniciada, Carlos Facchina Nunes guarda até hoje o contrato em seu cofre e diz que a relação de confiança permitiu que todas as cláusulas fossem cumpridas sem necessidade de assinatura.
RENOVAÇÕES
Em 1993, Mustafá Contursi assumiu a presidência do Palmeiras e se manteve no cargo até o fim da parceria. Ele garante que o contrato inicial, aquele que nem sequer foi assinado e tinha duração de dois anos, também não foi renovado. A cogestão se estendeu sob as mesmas bases. Os conselheiros palmeirenses, em determinados momentos, reclamaram da falta de acesso às renovações.
PALMEIRAS-PIRELLI
Era essa a primeira ideia de parceria da diretoria alviverde. Carlos Facchina negociava um contrato nos seguintes termos: como o Clube Atlético Pirelli apoiava as mesmas modalidades esportivas que o Palmeiras, haveria uma fusão de todas as equipes. Em contrapartida, a empresa patrocinaria a camisa do time de futebol. Os sócios teriam acesso aos dois clubes sociais. Porém, uma readequação interna na companhia italiana enterrou os planos.
E A PARMALAT?
A empresa de laticínios também negociava com a Pirelli o apoio ao time de vôlei, cujo técnico era José Carlos Brunoro. Com o fim dos esportes na companhia, o presidente da Parmalat, Gianni Grisendi, se aproximou do Palmeiras. Os primeiros contatos tiveram a participação de dirigentes famosos do clube, como Luiz Gonzaga Belluzzo, Gilberto Cipullo, Mustafá Contursi e Paulo Nicoli. Brunoro foi escolhido para dirigir a parceria. Ele era funcionário da Parmalat, que exigia participar da gestão.
APROVAÇÃO
Para convencer os conselheiros a aprovarem a parceria, Carlos Facchina convocou 20 por vez para reuniões em sua sala no clube. Explicou a negociação e se abriu para responder dúvidas. Depois, usou uma tática de sedução com Grisendi, presidente da Parmalat. Estimou em 70% a aprovação do contrato, que teve votação positiva de 97,4%. “Aí o homem ficou louco, o dono veio da Itália, eles ficaram loucos”, relembra o ex-presidente, que atribui também a isso os investimentos rápidos na equipe.
INVESTIMENTOS
O Palmeiras contratou, no início de 1993, numa só tacada, Edmundo, Roberto Carlos, Antônio Carlos e Edílson, entre outros. José Carlos Brunoro, atual diretor executivo do clube, diz que os investimentos não foram tão altos quanto se pode imaginar: “Isso é uma lenda. O jogador mais caro foi o Edmundo, que custou 1,2 milhão de dólares. O Roberto Carlos custou 500 mil dólares. Os jogadores queriam vir para a Parmalat porque viam como ponte para a Europa e sabiam que não haveria calote”.
CAPETINHA
Edílson foi um dos reforços impostos pelo presidente da Parmalat no Brasil, Gianni Grisendi. Ele viu o então atacante do Guarani estraçalhar o Palmeiras e apontou: “Eu quero esse rapaz!”.
GIANNI
A saída de Grisendi da Parmalat, em 2000, foi o mais forte indício do fim da parceria, já que a empresa voltou seus investimentos para sua própria equipe, o Etti Jundiaí. O empresário foi condenado, no fim de 2011, por crime contra o sistema financeiro. A sentença apontou que ele se utilizou de expedientes ilícitos na gestão do grupo, em operações desvendadas no auge da crise financeira da antiga patrocinadora do Palmeiras, que não é citado na decisão. O advogado de Grisendi, Luiz Fernando Pacheco, disse à reportagem que não conseguiu contato com o cliente, que pagou multa e prestou serviços à comunidade.
LUXA OU NELSINHO?
Nelson Rosa, campeão brasileiro com o Vasco em 1989, era o escolhido para comandar o time de estrelas do Palmeiras em 93. Brunoro (pela empresa) e Cipullo (representando o clube) entrevistaram dois técnicos. Rosa e o promissor Vanderlei Luxemburgo, campeão paulista pelo Bragantino em 90. Nelsinho era prioridade, mas disse que não poderia assumir imediatamente. Luxa passou no teste. O primeiro técnico da parceria, Otacílio Gonçalves, havia sido escolhido numa votação que envolveu os principais dirigentes da gestão.
“BLACK POWER”
José Carlos Brunoro relata como Luxa o convenceu, na entrevista, de que era o melhor nome: “Eu já queria o Vanderlei desde o ano anterior, mas ele chegou de camisa aberta, cabelo black power, eu falei: ‘nossa senhora’. Mas ele foi muito bem, estudou como o Palmeiras jogava, disse que precisava de poucos jogadores e que seria uma ponte para a Seleção. Acho que foi a primeira vez que ele falou de projeto (risos)”.
MARADONA
A Parmalat queria um jogador de impacto, que não fosse uma revelação como Edmundo ou Roberto Carlos, para atuar no marketing da empresa. E escolheu o craque Diego Armando Maradona. Brunoro foi à Argentina para conversar com seus empresários, mas nem sequer foi recebido pelo jogador, que rejeitou o plano de atuar no Brasil.
VOCÊ DECIDE
No contrato entre Palmeiras e Parmalat, havia uma cláusula que determinava: caso os dois lados não cheguem a um acordo sobre qualquer assunto, e haja uma radicalização de opiniões, valerá sempre a decisão do clube. Brunoro diz que foi o que aconteceu, por exemplo, em 1994, quando a equipe excursionou pela Ásia antes do segundo jogo contra o São Paulo, pelas oitavas de final da Libertadores. Até hoje, a viagem é apontada como fator decisivo para a eliminação do Verdão, que era favorito.
CALMA, EVAIR!
O matador palmeirense estava aflito na véspera da decisão do Campeonato Paulista de 1993. Com dores nas costas, ele vinha sendo poupado dos treinos por Luxemburgo, mas desconfiou e achou que não fosse jogar. Brunoro, então, o levou até o quarto do técnico, que lhe explicou tratar-se apenas de precaução. Não adiantou. Evair saiu e disse ao dirigente: “Ele não vai me escalar”. Evair jogou e fez dois gols na vitória por 4 a 0 sobre o Corinthians que selou um jejum de 17 anos sem títulos.
COMPRA UM, LEVA DOIS
1995 foi considerado um ano de transição da parceria, que planejava times para dois anos. Depois dos gloriosos 93/94, era hora de montar o time de 96. A Parmalat foi ao Guarani para contratar o jovem Luizão, mas o presidente do clube de Campinas fez uma imposição: só venderia o centroavante se o Palmeiras levasse também o meia Djalminha. “É o Djalminha quem lança o Luizão. Se os dois não jogarem juntos, não adianta”. O Guarani precisava de dinheiro e, após certa insistência, conseguiu emplacar a venda dupla.
SEM QUERER
Roque Júnior se destacou tanto no Palmeiras no fim dos anos 90 que disputou, como titular, a Copa do Mundo de 2002. Foi pentacampeão. Mas ele só chegou ao clube graças ao interesse na contratação do atacante Vinícius, que despontava no São José. Brunoro fez oferta e ouviu como resposta: “Tudo bem, mas vão ter de levar outro porque não tenho condição de pagar”. O outro era Roque. Enquanto isso, Vinícius jamais alcançou qualquer destaque.
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